29 dezembro 2014

Eu sinto sua falta loucamente

 
Quero que escreva para mim como se não houvesse outra coisa para fazer. Passe no mercado, compre leite, uvas, sente-se em uma cadeira e apoie-se em uma mesa enorme e escreva para mim. Quero ouvir seus pensamentos através das palavras, e poder afogar a sua falta nelas.

Eu soube que vai se mudar, conhecer pessoas novas e procurar um novo rumo. Tentei imaginar você em outros ambientes; seu cabelo ao sol, seus olhos observando as pessoas, seu riso de quando conhece algo totalmente novo. Pensei que talvez devesse usar sua melhor roupa nesse dia. Arrume seu cabelo de lado, fica melhor assim. Use preto, definitivamente. 

Eu sei exatamente qual é o sabor da despedida, tem gosto de chocolate 90% amargo; você o engole com vontade - mesmo sabendo que será horrível - e então o cospe fora e jura nunca mais provar um. Sei que você vai sumir, e que, provavelmente, conhecerá pessoas legais e inspiradoras. Que tomará vinho com leite condensado enquanto olha para fora da janela do quarto de alguém, que talvez se lembre de mim e de como sou muito boa em ser um prego entre os dedos. Sei também que sou o único motivo do porque você está indo embora. 

Ainda assim, espero que escreva para mim.

Conte-me sobre seus novos amigos, sobre como eles lhe adoram e qual é a sensação. Descreva suas risadas. Pergunte se eu gostaria desse lugar e mande algumas fotos para mim.

Eu farei seu prato favorito enquanto você estiver fora. Finalmente voltarei a perfumar a casa com meu perfume favorito (de rubi e pêssego, porque você odeia), e trocarei os lençóis dos quartos porque adoro o cheiro de pano limpo.

Espero conhecer alguém novo também, não alguém, mas algumas pessoas. A vida pode ficar muito solitária quando você recebe um pé na bunda. Espero que essa pessoa goste do meu perfume e repita que sou inspiradora e confiante. Que adore limpeza e seja muito organizado. Que depile os dedos dos pés, porque odeio dedos de pés cabeludos, e eu adoro pés. Que saiba cozinhar e não espere que eu cozinhe sempre, porque sou mesmo muito preguiçosa. 

E então eu me lembro que você já tem outro alguém, e que não escreverá para mim, porque aparentemente, mesmo que tenha sido você que me magoou, você agora me odeia. E eu entendo completamente porque você foi embora. Porque eu sou uma mulher completamente egoísta. Porque sou obcecada com a ideia de que preciso viver sozinha, por que é isso que a vida reservou pra mim. E eu realmente preciso. Preciso chegar em casa - na minha casa - e saber que ela vai estar do mesmo jeito que deixei, porque sou egoísta a esse ponto. Preciso poder ter privacidade, mas não essa privacidade completamente falsa de casal, mas a minha privacidade individual. De ter essa ideia de que eu posso me virar, que não dependo de ninguém e tampouco ninguém de mim. Você consegue imaginar alguém dependendo de mim?

Eu menti. Não quero que escreva para mim. Por que isso é totalmente fodido, e vai me fazer querer fumar um cigarro e correr pela casa. Porque eu sei que você é uma pessoa maravilhosa, cheia de coisas boas dentro de você, e que talvez eu tenha perdido uma chance de ser feliz por não ter tido coragem suficiente de admitir que eu sou fraca como qualquer outro ser humano que tão desesperadamente escreve uma carta de despedida sem nem sequer ser a pessoa que está indo embora.  

Juro que tento entender a vida e quem eu sou - principalmente quem eu sou, porque isso tornaria as coisas tão fáceis -, entender o que eu quero, o que eu procuro. Mas acho que quando você encontra as respostas para essas perguntas você não está realmente vivendo, está? 

A essa altura do campeonato você já deve ter se dado conta da confusão que eu sou, não que não tenha notado antes, mas acho que agora ficou um pouco escancarado. Então quero que empacote sua felicidade nessa mala pequena que te ofereço, e corra o mais longe possível de mim. Corra até seus pés sangrarem e você ter certeza de que está longe o suficiente. Porque, honestamente, nesse mundo repleto de novidades e modernices, a unica coisa boa que posso te oferecer é um copo cheio de álcool e uma boa noite de cama. E você aceitaria.

15 outubro 2014

A arte do "faz-me rir"


No drama, nunca tive muito apego à personagens irônicos, a tendência era que eu acabasse os considerando meramente ilustrativos, ou um-personagem-qualquer-que-foi-posto-no-roteiro-pra-entreter. A ironia, em si, não é algo que me agrade muito. Gosto de um exemplo aqui, outro ali, mas na maioria das vezes acho que ela está sendo utilizada de forma incorreta. É o mesmo com usar "liberdade de expressão" como desculpa pra xingamentos; as pessoas acabam tirando proveito de qualquer brecha. 

Uma vez estive em um debate na área de multimídia da escola, uma criatura carrancuda, de expressão séria e pouco sentimentalismo, falava coisas que não pareciam corretas, sequer demonstravam ter sido expostas baseadas na opinião dela. Sabe aqueles discursos que você encontra na parte de "Sermões Religiosos Amadores" na internet? Isso mesmo. Era um sermão religioso-puramente-satisfatório e de agrado aos demais companheiros. 

Infelizmente, tenho o costume de ser além de briguenta, uma pessoa que tem gosto pela arte de dissertar, logo me vi discutindo com alguns colegas o quanto discordava daquilo, o quanto não somos obrigados a escutar sermões religiosos na escola tão somente como não somos obrigados a estudar religião, e como, de forma estupida porém útil, isso tem agradado os artistas do "faz-me rir" à explorar a bondade do cidadão até a ultima gota com Deus como background. 

Não me entenda mal, alguns sermões são agradáveis (e olhe que estou longe de ser religiosa), mas de gente que realmente entende do assunto, gente que, acima de tudo, valoriza a questão moral bem mais do que a persuasão. Não esses mesquinhos que usam a distância da "maldade" e tudo que há de bom como beneficio da religião, e a precariedade, a diversão, o prazer e até mesmo o sexo como o caminho obscuro daqueles que se distanciam do seu Senhor. 

"Não temam! Eles serão julgados por isso. Eles, que escolheram às drogas, o sexo sem compromisso, o homossexualismo, eles irão para um lugar muito diferente dos seus; vocês estarão banhados de doçura, calma e paz enquanto o couro deles queimam no fogo eterno." Sim, meus caros. Você, que já fumou umzinho, que já virou um copo inteiro de vodka, que já transou com o irmão da sua melhor amiga, você vai queimar eternamente por mais que tenha fé. E por mais que você acredite e defenda, que ame, que cuide, você não será julgado pelo que é e sim pelos seus atos. 

Os artistas do faz-me rir são compromissados a exaltar à eles próprios, não ao seu Deus. A enaltecer a minoria conservista e baixar a esperança do que usa o "aparelho excretor que não reproduz" para ter prazer, de ter um lugarzinho no paraíso. O artista do faz-me rir usa o medo como arma principal, mas não o medo pleno, o medo que ele sabe que vive escondido nas profundezas do seu publico alvo (os falsos - e clichês - tementes), o medo de que pensamentos e atitudes "impuras" venham a acarretar uma eternidade de terror ~emsuapósvida~  no fogo pleno. Ou seja, fazem uso do falso para dominar as pessoas, para ter certeza de que elas não abram os olhos e enxerguem suas falácias de uma forma realista, pois EI, ISSO É SACRILÉGIO.